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Naked (1993) de Mike Leigh é soberbo

Não sei dizer como é que ainda não tinha posto os olhos em Naked (1993), uma vez que se situa como um filme de culto britânico desde a sua estreia em Cannes no ano de lançamento. Mike Leigh dá-nos uma história bruta, rodeada de ambientes que lhe fazem jus. Nas vivências suburbanas entre Manchester e Londres, Johnny é um vagabundo em busca de emoções e de se sentir vivo, a quem a ideia de bom senso não diz nada. A rudeza das ruas geladas da cidade condiz em perfeição com o isolamento que os seus habitantes sentem, num período de incerteza que evoca o virar do milénio como um possível apocalipse. Se esse apocalipse seria real ninguém sabia, mas a crise espiritual e humana está bem latente em cada interação dos personagens.

O filme começa com um plano geral de Johnny num beco com uma mulher, enquanto têm relações sexuais e claramente ele passa a linha do agradável para a magoar. Isto acontece várias vezes ao longo do filme, notando que ele é uma pessoa sem noção dos limites. Ou, se tem noção deles, faz da sua missão ignorá-los. Johnny não é um herói. É rude, trata mal toda a gente, absorve cada espaço em que entra com as suas ideologias distorcidas e não mostra a mínima preocupação com os outros. 

Claro se torna esta faceta da sua personalidade quando vai visitar a sua ex namorada, em Londres, e a primeira coisa que faz é entrar em relações sexuais com a sua companheira de casa. Louise, no entanto, é o oposto dele. Verdadeira, corajosa e até doce. A maneira como Johnny a trata, em comparação com todas as outras personagens, a quem só mostra desprezo e neuroticismo, evidencia o quão é especial. 

No entanto, apesar de todo este desprezo, nós enquanto espectadores nunca deixamos de torcer pelo personagem, interpretado por David Thewlis de uma forma brilhante. Mike Leigh é conhecido por dar espaço aos seus atores para improvisação, na tentativa de criar personagens multidimensionais. Neste filme acertou em cheio, e Johnny tem tanto de Mike Leigh como de Thewlis. Os diálogos, que vagueiam entre o o absurdo e o soberbo, saem da boca do  ator com emoção a cada palavra e as expressões faciais valorizam cada frame. O filme é a sua personagem principal, a quem seguimos até ao fim. 

Se é detestável por tudo que faz, mantém nos presos por estar constantemente á procura de respostas para as suas infinitas inquietações.

Em contraste vemos a personalidade de Jeremy, senhorio da casa de Louise, que é verdadeiramente cínico, sem nunca se tentar redemir da sua falta de compaixão.

A sonoplastia do filme está muito bem feita, com sons e musicalidades que exponenciam o sofrimento no ecrã. É um filme para ver com atenção e certamente rever muitas vezes.






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