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The Last Of US II (2020)

Não foi há muito que joguei "The Last Of Us" na PS4. Por isso ainda tenho muitas das suas cenas vívidas na memória. Apesar de ter mudado de opinião sobre o jogo entretanto (que na altura achei desolador) devido á natureza crescente e abundante que circunda toda a tragédia e a essência da relação de Joel e Ellie, não deixa de se fazer sentir o desconforto perante toda a violência e dor que se apresenta no universo. É-me simplesmente difícil de digerir. Ainda assim, achei o primeiro jogo bem melhor do que o segundo, devido á profundidade com que se explora toda essa componente emocional.

Se o primeiro jogo se centra maioritariamente na construção de uma relação de afeto entre Joel e Ellie, o segundo foca-se mais no sentimento de luto e de vingança.  Apesar de existirem várias relações de amorosas e de afeto, elas são secundárias e não a ignição da narrativa. No tema central temos as perspectivas de ambas as protagonistas do jogo: Ellie e Abby, que inicialmente é claramente a má da fita mas quando somos obrigados a jogar com ela somos também obrigados a pôr todos os nossos julgamentos em questão. 

Ora, o problema disto que é trai as nossas expectativas e nos obriga a empatizar com a vilã, mostrando que as suas razões são tão válidas como as da heroína. Se isto pede alguma maturidade por parte dos jogadores? Talvez. Mas eu só queria ver a Ellie e o Joel a chegar a bom porto e, quem sabe, conseguir salvar a humanidade. Mas este não é esse tipo de jogo. E na realidade nunca foi.

Que tipo de jogo é? É um bom jogo. Mas um que nos prende num enredo muito limitado no tempo, que se explica através de flashbacks e pouco desenvolve ou explica o que se está a passar naquele mundo para além das personagens em que se foca.

Temos um mundo quase tribal, em que as comunidades humanas se dividiram e juntaram depois em frações e todos são inimigos uns dos outros. Se isto podia ter muito interesse, que podia, perde pela explicação superficial que dá do que move cada grupo e do que os distingue.

Além disso, penso que se The Last Of Us II poderia funcionar bem como parte de uma triologia que não sabemos se existirá, falha em dar continuidade á história lançada no primeiro jogo. E é um bocado ingrato deixar os jogadores, depois de tanta espera, numa situação em que não obtêm respostas quase nenhumas. 

Nada a apontar á execução técnica e admiro a coragem da integração de várias personagens LGBT, normalizando-as e aumentando a sua exposição e relevância. Percebo ainda o que se tentou fazer com a "história de vingança" tão publicitada. Mas para mim este jogo só faz sentido do ponto de vista narrativo se tiver como propósito ser uma ponte entre "The Last Of Us" e um possível terceiro título. Muitas da questões centrais do primeiro jogo são nesta continuação simplesmente ignoradas. Quando mencionadas, são imediatamente ofuscadas por situações que necessitam de resolução muito mais imediata como um ataque de um grupo de infetados ou uma emboscada de um grupo inimigo.

"The Last Of Us II" é um bom jogo tecnicamente, com imensos detalhes, como seria de esperar da Naughty Dog. Tem uma história muito triste e faz-nos sentir isso a cada avanço.  Mas tem também falhas que tiram credibilidade ao mundo, que não se esperam de uma produção desta magnitude. Para melhor ilustrar esta ideia, seguem-se spoilers de pontos principais da história. Por isso só se aconselha a leitura a quem já jogou o jogo todo ou a quem não se importe de saber o que acontece.

Antes de mais, o que aconteceu aos pirilampos? Porque é que acabaram? Já ninguém anda à procura de uma cura para o vírus? É apenas um mal a mais com que se lida normalmente?

No primeiro jogo acabamos a história com um Joel que se torna inimigo dos pirilampos, para proteger a pequena Ellie. Mas neste segundo quando um grupo de estranhos lhe perguntam o nome ele não hesita em dizer-lhes, habilitando-se a expôr-se a si a aos seus a graves perigos e o que acaba por dar origem à sua morte. Isto não condiz com a personagem que conhecemos, experiente em matérias de sobrevivência e proteção. 

E apesar de ser chocante o facto de Joel morrer, não me surpreendeu minimamente. E não foi por causa dos spoilers prévios ao lançamento do jogo, que não vi. Foi porque já vi isso feito noutro jogo, também de zombies, em "The Walking Dead" da Telltale. A decisão de eliminar a figura paternal para emancipar a figura feminina é eficaz, mas não é nada de novo. E a perda de Joel é muito significativa para o universo do jogo para ser feita com tão pouca originalidade.

Pronto, mas é por Joel se identificar inocentemente a um grupo de estranhos que morre. E é por isso que Ellie se lança numa vingança contra Abby, que foi quem matou Joel. Vamos então à caça da Abby, de Jackson a Seattle, onde se passam 3 dias até a encontrar, durante os quais eliminamos muitos dos seus companheiros. Quando a encontramos, no Teatro de Seattle, voltamos atrás no tempo e jogamos esse período de tempo na pele de Abby e ficamos a conhecer as suas motivações para matar Joel, chegando até a percebê-las, até que chegamos ao ponto em que tínhamos ficado, o confronto com Ellie no Teatro.

Depois, temos de a enfrentar, pois a sua vendeta eliminou a maior parte dos amigos de Abby e este ódio visceral não pode passar impune. 

No combate entre Abby e Ellie (jogamos com Abby) o que se experiência é um sentimento de total esquizofrenia em que cada vez que deixamos Ellie matar Abby parece que ganhamos, apetecendo apenas o suicídio constante mas tendo que enfrentar a batalha para avançar na história. Não sei se faz muito sentido... Ainda para mais quando isto acontece várias vezes até que temos de matar Abby (ao jogar com Ellie) e devido à empatia que criamos com ela também já não queremos que isso aconteça. A nível de gratificação não fica muito a ser dito, é uma constante frustração. 

Além disso não percebo como é que Ellie e Dina, juntamente com o pequeno JJ, vão viver para o meio das montanhas numa quinta isolada e protegida apenas com uma grade. Se fosse assim tão fácil, porque é que as restantes comunidades andariam a colocar-se em risco, nas cidades cheias de infetados? Essa parte também não me convenceu.

No fundo, e apesar de Joel morrer na parte inicial, todo o jogo é sobre ele. Ellie está de luto e quer-se vingar... e nós vamos sentir isso com ela. Abby também está de luto e nós vamos sentir isso com ela. No final não sobra grande coisa. Sabemos que os pirilampos voltaram, mas não há indícios do que vão fazer. E Ellie? Ficou sozinha a ter de avançar numa vida sem proteção. Chegamos à conclusão que é uma história sobre o perdão. Mas isso é suficiente?



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